sexta-feira, 13 de abril de 2012

ADVOGADO DO DIABO


Hoje como tantos outros que passaram, mais uma vez os guinenses a lamentar e a palpitar o diabo entre nós. Triste e lamentável, dizem aqueles que mesmo querendo, não entendem o por quê de tanto sofrimento deste povo  do qual já não há dúvidas de desespero ao olhar para rostos de homens e mulheres sem rumo e sem destino, mas que ainda acreditam e confiam num dia melhor. Da nossa parte, como guinense, não deixaríamos de lamentar junto com tantos outros filhos deste país a forma como está a ser conduzido o destino das nossas vidas.
No entanto, diferentemente de vários compatriotas e aqueles que amam este país, não limito-me lamentar os factos, sinto-me na obrigação de fazer um exercício de reflexão sobre os mesmos dentro dos limites subjectivos do acto de reflectir, não faço nada mais que mapear o meu olhar sobre a situação que se vive no meu País.
A um tempo atrás escrevi sobre actuação da comunidade internacional na gestão de crises nos países subdesenvolvidos, as estratégias e a forma como essas crises costumam ser interpretados sob ponto de vista do colectivo das instituições que constituem aquilo que chamamos comunidade internacional. Quanto à acção, mostrei a forma como os mecanismos da intervenção destas instituições estão balizados por modus operandi institucional  determinado pelo critérios burocráticos dissociados às necessidades e urgência da problemática em causa. Deste modo, a acção como resultado prático, ela só é concretizado sob orientação de um processo de avaliação do custo- benefício, algo muito diferente daquilo que constitui o imaginário leigo da estrutura do gestão de crises por parte da comunidade internacional.
Esta forma realista de ver actuação da comunidade internacional, permite entender o conceito de   "acção humanitária" como um termo "politicamente correcto" para denominar a intervenção da gestão de crise num país, somente, no âmbito conceptual do termo. No  pratica, a concretização de acção, ela é entendida como resultado dos interesses expressos em formas duma estrutura burocrática institucional como instrumento que configura "modos de fazer" da diplomacia internacional. Isso dito de outra forma, traduz-se que, a estrutura de diplomacia é a continuidade da lógica do mercado no âmbito político, é esta lógica que determina e orienta  os modos de fazer das instituições internacionais pautada para custo-beneficio mesmo quando os discursos não a apresentam desta forma. Nesta óptica,  os discursos mediativos são a encenação teatral para plateia leiga que não vê os bastidores do ensaio.
Quanto a estratégia da intervenção, ela é simplesmente remota e obsoleta, não acompanha a evolução das sociedades a quem é destinada, está em descompasso com a realidade que se vive nos nossos países, isto sem considerar a sua brutalidade que ignora os valores culturais e tradicionais das sociedade à quem é imposta. 
Posto isto, podemos entender as situações em que a comunidade internacional em vez de ajudar a fazer gestão de crise, ela agrava a situação, envolvendo, muitas vezes, os nossos países em situações de caos, guerras civis, conflitos étnicos, hostilidades regionais etc... 
No caso especifico da Guiné, o que se viu é o cúmulo da irresponsabilidade e indiferença para com os ingredientes de um conflito eminente. A lógica do funcionamento da diplomacia internacional incitou de um lado, arrogância por parte dos governantes em desavenças com as forças armada, por ganancia e orientados pelo discurso da comunidade internacional no eventual protecção à sua segurança em caso de um eventual desordem por parte dos militares, ao em vez de optar  pela estratégias de gestão interna da crise eminente, optaram por discursos de confronto, enquanto a situação do país estava tensa com os  militares a darem sinais de crise, optaram por gritar viva a comunidade internacional, viva a Missang, como quem diz, a nós não conseguem fazer nada porque temos o apoio da comunidade internacional e seu exercito virtual. Mais uma vez, tornaram-se vítimas do tradicional discurso institucional da diplomacia internacional que, na prática, nunca se concretiza, pelo menos, o percurso histórico do nosso país evidencia este facto. Por outro lado, vimos despertado o  oportunismo de um grupo de políticos, na oposição, que por sua influência na forças armadas, viram no processo eleitoral um escape para concretizarem seus interesses oportunistas anti-democrático, pondo em causa a credibilidade do acto eleitoral, chamando atenção dos militares sobre a fragilidade institucional entre estes e  o governo virado à ilusões alimentadas pela  comunidade internacional. 
Tanto o governo que de maneira arrogante não soube administrar a situação que se vivia no país, quanto os políticos que mais uma vez instrumentalizaram os militares vulneráveis à qualquer influencia, contribuíram  para o constrangimento do processo da estabilidade do país. Enquanto isto, a comunidade internacional limita-se em condenar no seu tradicional discurso "apelamos reposição de ordem constitucional" mesmo quando em momento algum houvesse esta ordem.
O problema com os golpes de Estado na África transformou-se numa tradição mímica porque não há acção preventivo, muito menos, coercitivo destes actos, no pior dos casos, o que ouvimos é a condenação da comunidade internacional restrita ao discurso. Várias experiências, tem nos servido de exemplos como os golpes são espelhados um ao outro e em todas situações a comunidade internacional mantém a mesma posição, mas não tarda em legitimar os golpes, mesmo que inconscientemente, nestes países continuam embaixadas de diferentes países, continuam as empresas internacionais, continua-se negociar acordos económicos com os governos golpistas, as relações bilaterais continuam sendo sustentados porque servem aos interesses do mercado. 
Se os golpes são admitidos, legitimados em alguns casos pela própria comunidade internacional, esta prática torna-se comum e continua. Na sua  recente declaração, o porta voz das forças armadas guineense, deixou subentendido que em vários países africanos foram dados golpes nada foi feito e na Guiné também se o mesmo acontecesse, nada aconteceria. Isto mostra que, perante ausência de acções coercitivo a nível internacional às situações deste tipo, nada travará estes comportamentos no nosso continente a não ser que haja autoridades nacionais competentes para gerir as situações de crise internamente e , a cima de tudo, acreditar na nossa potencialidade em busca de soluções para nossos problemas internas, através de um diálogo franca e objectiva. 
Constitui uma ingenuidade politica gritante orientar a nossa política pela lógica de actuação da comunidade internacional, é uma estupidez tremenda acreditar que um dia vai a ver conjunto de militares para invadir o nosso país com intuito de prender os nossos militares corruptos e incompetentes. Isto só acontece nos países ricos em petróleo, nós não somos nenhum Líbia na África ocidental para merecermos este investimento. Há que perceber que, envio de qualquer contingente militar para um país, na óptica da diplomacia internacional, significa um investimento que custa muito dinheiro aos Estados participantes, o país a quem se destina tem de ter, a cima de tudo, a potencialidade económica para cobrir este investimento. Infelizmente, esta não é realidade do nosso pobre país. Vale salientar que, com a crise económica estrutural que abalou as economias  dos países, os Estados estão pautados na redução dos custos e despesas. Um país que se viu obrigado a cortar os efectivos na função pública a busca do equilíbrio orçamental (como é o caso de Portugal), este país, mesmo tendo a  vontade, não o faria porque a questão, não se limita à vontade de ajudar Guiné, a questão é: quem vai pagar?
Eis a complexidade da situação que para muitos é simples e fácil. Seria nos mais fácil pautarmos pela resolução das nossas "tretas" internamente.       


Um comentário:

investigaçãobolama disse...

Procuro informações sobre o naufrágio do navio luso-guineense Bolama ocorrido a 4 de Dezembro de 1991. Um dos proprietários era Carlos Gomes Júnior (Cadogo). Investigação jornalistica. Sigilo absoluto. Ver blog: naviobolama.blogspot.pt